Dois tipos de magia são discriminados pelos estudiosos
de todas as épocas: a Alta Magia
e a Baixa Magia. Jamais devem
ser confundidas com magianegra ou magia branca, que se tratam de tipos
de magia arbitrariamente designados como tal pela idiossincrasia da
moral de quem as trata assim.
A Baixa Magia seria a magia
de cunho terrestre, geralmente pagã (na acepção
etimológica original da palavra: "do campo" e não
como posteriormente adotada "não cristão") é
baseada no desregramento dos sentidos. É baseada na carne, na
terra, no suor, no sangue. É o tipo de ritual praticado pelas
tribos ditas "primitivas" e pelos cultos afro-americanos em
geral.
A Alta Magia seria a magia
do controle, a magia do domínio da realidade pelo homem. É
um tipo de magia intelectualizada e fria, baseada no "puro espírito",
ou melhor, na separação platônica da carne e do
espírito. O Mago escraviza entidades, ordena coisas, e para tal
tem que ser controlado tanto por dentro quanto por fora. O Mago Cerimonial
(de Alta Magia) é um sujeito que pratica a abstinência
dos prazeres corporais, pois só pode dominar o macrocosmo se
seu microcosmo estiver dominado. A missa é um exemplo de ritual
de Alta Magia, no sentido de que o padre prega, faz sermão, amedronta,
os outros participantes do ritual. Eles comem a carne e bebem o sangue
de cristo (resquício pagão) e recebem o Espírito
Santo. Tudo muito frio e ordenado, baseado no dogma de um livro. (A
missa já foi ainda mais cerimonial e cheia de etiqueta, mas um
concílio resolveu popularizar o ritual, trocando o latim e o
padre de costas pela conversa franca e ameaçadora de um padre
regendo pessoas). Na verdade a maioria dos magos cerimoniais eram padres
ou abades. Eliphas Levi é o maior exemplo.
Existe um sistema, um dogma, comum entre ocultistas modernos, que
prega a sucessão éonica. Éons seriam períodos
de tempo regidos por uma divindade ou característica dominante.
Assim, períodos de tempo grandes, mais ou menos 2000 anos, recebem
um rótulo, uma divindade, um signo zodiacal, uma característica
política, social e uma característica religiosa dominante.
Não vou aqui discutir a propriedade do sistema, pois de certa
forma ele pode ser entendido de diversas formas e em alguns casos fica
evidente. Acredita-se que o presente éon começou neste
século ou está por começar, e as características
desse Novo éon ainda são enevoadas. O que pretendo aqui
é associar os "estilos" de magias com seus respectivos
éons, e delinear o que pode ser o novo tipo, o que pode ser a
magia da "Nova Era".
O primeiro éon (da época histórica) seria o da
Deusa, como geralmente a iconografia é egípcia (a idéia
de "Aeons" seria originalmente egípcia), Ísis
ou Nut ficam como regentes desse período. Geralmente se atribui
uma organização social matriarcal a este período,
mas esta idéia é historicamente incorreta. A organização
era tribal ou em clãs, em geral patriarcais mesmo. (Algumas sociedades
já tinham até um estado semelhante ao moderno, mas baseado
em dinastias, como o Egito. Na verdade o Egito e o Oriente Médio
nos deram a religião e a organização social do
próximo éon, o de Osíris, e mesmo hoje existem
tribos que vivem no éon de Ísis, os compartimentos não
são estanques.) Os homens que viviam em meio a natureza abundante
ainda não tinham desenvolvido agricultura, simplesmente colhiam
as dádivas da Deusa. Politeísmo, amor filial, culto da
terra, etc, como valores essenciais. Não se conhece muito a respeito
das culturas verdadeiramente do éon de Ísis simplesmente
porque elas não dominavam a escrita.
O segundo éon se atribuiu ao deus Osíris. E é
basicamente o que conhecemos por cristianismo, feudalismo, patriarcado,
exploração indômita da terra, organização
rígida, medo como método de coerção social,
"progresso" científico, absolutismo, etc.
Neste século ocorreu uma mudança mais brusca do que
nos outros éons. O mundo está mais unificado e age mais
em conjunto, apesar das diferenças. Todo o progresso científico
gerou uma revolução a nível psicológico-antropológico
muito maior do que nós, que só conhecemos isto, podemos
notar. Crianças só conhecem leite de caixinha, e só
viram vacas pela TV. A família se dissolveu, os núcleos
familiares são cada vez menores. As pessoas jovens são
essencialmente não religiosas e adogmáticas. Isso é
visto como catástrofe por muitos. Na verdade qualquer transformação
é dolorosa, mas não podemos ser pupas para sempre.
Não é possível, hoje em dia, ser sincero com
relação a rituais sazonais, de colheita, etc . O homem
moderno não depende mais da capina, ele compra no supermercado.
Ele devia fazer rituais quando os preços subissem, e não
quando a estiagem chegasse, se fosse o caso. O movimento neopagão
cresce a cada dia, mas está fadado ao anacronismo, nós
perdemos o contato com a terra. Faz mais sentido ir a um show de rock
do que girar em volta de uma fogueira pedindo para que não falte
milho.
O individualismo não permite mais religiões de massa.
A religião do futuro ou é a ausência de religião
ou uma religião individualizada. As pessoas não precisam
mais serem aceitas em seu grupo social para sobreviverem, como antigamente.
As pessoas não dependem mais dos filhos para comerem, portanto
não precisam de muitos filhos. Controlamos nossa fertilidade.
Isso é um marco pouco percebido. A TV foi a última e grandiosa
manifestação do éon passado, com sua pregação
par a as massas. Em pouco tempo, via Internet, ninguém vai assistir
a mesma novela que o vizinho, a diversificação vai ser
tamanha que vai ser impossível passar uma mensagem coerente no
sentido de um conspiratório e paranóico domínio
das massas.
Enquanto a Baixa Magia ressurge em alguns movimentos, como num canto
do cisne, a Alta Magia morre. Ninguém mais agüenta uma ladainha
fora da realidade como a que acontece nas Igrejas, ninguém agüenta
aprender hebraico e grego para chamar espíritos, estudar cabala,
e ficar fazendo pose de sério dentro de um círculo. As
pessoas estão cínicas e irreverentes demais para isto.
Se sentiriam ridículas fazendo isso.
O futuro da magia está na física quântica e na
realidade virtual. A catarse das raves prova que o homem não
deixou o corpo para trás, como se esperava no éon passado.
Informação é o poder do Mago moderno, que não
trabalha nem com a pena tampouco com a espada, trabalha com o teclado,
à velocidade da luz. O mago não trabalha na inocência
ou na ordem, trabalha no Caos. E que fique entendido que isso não
é evolução, progresso, melhoria. É transformação,
como da pupa para borboleta ou de ser vivo para cadáver putrefato.
Aurora
Wirth
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